Na mitologia grega, Proteu é um deus marinho, um dos velhos do mar, filho de Oceano e Tétis. É uma figura com a capacidade de prever o futuro e de mudar de forma física para afugentar os pouco corajosos. Procurava assustar ou fugir dos mortais inoportunos.
Recentemente, as suas habilidades têm passado a ser relacionadas às características profissionais que se têm feito necessárias nos dias de hoje: capacidade de se adaptar, planejar e redefinir a própria carreira, de acordo com o contexto.
Até a década de 1970, o que se observava nas carreiras tradicionais era a busca de estabilidade e segurança até a aposentadoria, lealdade absoluta à empresa, hierarquias bem definidas, treinamentos formais oferecidos aos funcionários e oportunidades de crescimento vertical, de acordo com cada função. A partir da década de 80, entretanto, o que vemos são carreiras sem fronteiras, valorizando a satisfação pessoal e profissional, e durando enquanto houver desafios e interesse tanto por parte da empresa quando por parte do funcionário. A ele cabe o seu próprio desenvolvimento, como forma de alcançar oportunidades de crescimento e o sucesso psicológico, pautado no respeito aos seus próprios valores e na possibilidade de equilíbrio entre vida pessoal e trabalho. Observa-se, neste contexto, uma maior flexibilidade de papéis, mais trabalhos em rede e menos hierarquias. A lealdade e o compromisso são totalmente em torno do projeto a ser realizado
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Em 1993, o psicólogo Robert Jay Lifton utilizou pela primeira vez o termo Eu-Proteu como uma maneira de pensar esse sujeito contemporâneo, que vive cada vez mais essa experiência de um tempo fluido (a “modernidade líquida”, de Zygmunt Bauman).
Nasce o chamado “profissional proteano”, do qual espera-se versatilidade, flexibilidade e adaptabilidade para garantir a sua sobrevivência social e o alcance dos seus objetivos de carreira e de vida. Torna-se imprescindível, portanto, a capacidade de buscar o autoconhecimento e o desenvolvimento das próprias competências, de planejar a própria carreira com base em uma visão de futuro compatível com seus objetivos, bem como a capacidade de decisão sobre mudar de emprego ou redefinir a carreira, a fim de aproximar-se o máximo possível da sua realização.
Entretanto, essa é uma via de mão dupla. Se por um lado, tem-se mais liberdade, mais flexibilidade e possibilidade de realização, por outro, tem-se também muito mais responsabilidade. Talvez antes, a “responsabilidade” pelo crescimento profissional fosse atribuída muito mais à empresa (ou ao menos partilhado com ela), e discursos comuns eram: “a empresa não dá treinamentos”, “a empresa não prepara os funcionários”, “a empresa não valoriza os funcionários”, “a empresa prometeu que eu seria promovido até o final do ano”, etc. Hoje, o que se percebe mais é o envolvimento do profissional em seu próprio desenvolvimento, a busca por oportunidades dentro e fora da organização, formação e atualização, realização de cursos relacionados aos seus objetivos pessoais e profissionais (independentemente se é interesse da empresa ou não), com discursos muito mais voltados para “preciso de um novo desafio”, “se não estiver feliz aqui, vou buscar uma outra oportunidade”, “quero alinhar meus valores e equilibrar os diferentes aspectos da minha vida, ao meu trabalho”, “quero fazer aquilo de que gosto”, etc.
Neste contexto, diante de tanta autonomia, o mérito pelo sucesso na carreira passa mesmo a ser atribuído ao profissional. Porém, qualquer insucesso também é atribuído a ele. E, se eu não sei lidar com “fracassos”, “erros”, “dificuldades”, e passo a ser “culpado” eu mesmo, terei grandes problemas para me reerguer e continuar o meu caminho. Por isso, a gestão de si mesmo implica um mínimo de preparo, maturidade e equilíbrio emocional para ser bem conduzida. Capacidade de lidar com a frustração, resiliência e determinação são características fundamentais para os jovens profissionais que vivenciam esse contexto, cheios de sonhos e expectativas de construírem com as próprias mãos aquilo que acreditam ser melhor para o seu futuro. O grande questionamento aqui é justamente se eles estarão preparados para lidar de maneira adequada com as diversas possibilidades que encontrarão pelo caminho. E já que estamos falando de um caminho gerido por si mesmo, o investimento no cuidado pessoal (não somente profissional) deve fazer parte desse trabalho em busca da própria realização. A começar pelo autoconhecimento e pelo desenvolvimento de competências emocionais e comportamentais (não somente técnicas), passando por atividades voltadas para saúde, lazer e relacionamentos, fazem um grande diferencial neste processo de lidar com tantas mudanças e grandes responsabilidades.
Ao citar este artigo:
FRANÇA, C. B. Título do artigo. Salvador, Data de publicação do artigo. Disponível em: link do artigo. Acesso em: data de acesso.